Novo livro mapeia a formação das instituições políticas no diálogo entre a Antiguidade, a Modernidade e a Contemporaneidade
17 de abril de 2023
As democracias ocidentais contemporâneas resultam de um longo processo histórico que se deu a partir do diálogo com a tradição política ocidental. Por essa razão, compreender os fundamentos e as práticas políticas da Antiguidade e da Modernidade é importante para o entendimento dos contornos da política atual e das principais transformações das instituições políticas hoje operantes. O novo livro “Uma Introdução à política: Estado de direito, democracia e instituições da Justiça” se situa no campo da interpretação histórica das instituições, estabelecendo diálogo político entre, de um lado, a Antiguidade, e do outro, a Modernidade e a Contemporaneidade.
Ao revisitar o nascimento da política em suas tensões e virtualidades gregas, passando por importantes aspectos do pensamento e das práticas políticas medieval e moderna, os autores Marcel Albiero da Silva Santos e Violeta Sarti Caldeira elaboram uma análise introdutória das principais instituições políticas encontradas nas democracias ocidentais atuais – dando ênfase às instituições da Justiça e ao direito, com destaque à situação das instituições políticas brasileiras contemporâneas. A fim de ilustrar a experiência política na Antiguidade, a obra apresenta as tradições cultural e filosófica gregas e os fundamentos teóricos das práticas políticas na Grécia clássica. Partindo deste contexto, os autores discorrem sobre a gênese do moderno Estado de direito; o individualismo na Modernidade; o liberalismo e a concepção de Estado como elemento em constante tensão com a sociedade; a racionalização do direito; as origens do Poder Judiciário e seu posterior papel político; e o Judiciário no Brasil – para então tratar da cidadania e democracia no Estado de direito.
Da Antiguidade ao Estado de direito: uma nova tradição política
A gênese do moderno Estado de direito marca os séculos XVII e XVIII, e se caracteriza pelo empenho na defesa e garantia de direitos individuais subjetivos considerados fundamentais – refletindo as revoluções que agitaram o período, sobretudo nas sociedades inglesa e francesa. “Esse modelo de Estado se origina na ambiência do liberalismo ético-político do século XVIII, visão de mundo que advogava a existência de um conjunto de direitos individuais que passara a ser reivindicada como garantia essencial da dignidade humana, os quais seriam naturais, universais, anteriores ao Estado, inalienáveis e oponíveis aos poderes instituídos”, explica o autor Marcel Albiero da Silva Santos, doutor e mestre em Filosofia, também graduado em Direito. Sob tal concepção, o Estado não deveria, em hipótese alguma, violar a esfera de autonomia individual constituída pelos direitos.
Para alcançar essa meta, projetaram-se instrumentos jurídico-políticos que limitavam o exercício do poder, como os princípios do império da lei (rule of law) e da separação de poderes. “Em relação à tradição política da Antiguidade ocidental, fundada na busca do bem comum, do interesse da polis e da felicidade dos súditos (eudemonismo), o surgimento do Estado de direito assinala uma ênfase inaudita nas liberdades individuais e na autodeterminação do indivíduo. O exercício do poder deixa de priorizar a coletividade e de atuar positivamente para a realização do bem comum e passa a garantir a autogestão de interesses privados por meio do reconhecimento de limites jurídicos para o próprio poder”, complementa o professor.
O papel político do Judiciário
No fim do século XVIII, as funções judiciárias deixam de operar como simples extensão do poder soberano; passam, então, a refletir o primado de proteção aos direitos fundamentais individuais encampado pelo Estado de direito. O Poder Judiciário independente consolida-se como aspecto constituinte do Estado de Direito e assume a tarefa de limitação e fiscalização do poder em favor dos indivíduos. “Num primeiro momento, de acordo com a concepção fortemente individualista de direitos fundamentais vigente nos séculos XVIII e XIX, o Poder Judiciário servia muito mais como freio ou contrapoder do que como poder ativo. Mas o Judiciário também se viu elevado a autêntico poder político quando se lhe facultou (como nos Estados Unidos recém-independentes) o controle de constitucionalidade dos atos do Legislativo, pois assim passou a participar do processo decisório de instituição do direito positivo, também estabelecendo regras de aplicação geral a todos os cidadãos, e não apenas aos litigantes particulares”, contextualiza o autor.
O papel político do Judiciário no século XVIII serviu, de certo modo, como estopim para a maior participação desse poder sob o Estado social nos séculos seguintes – delineando, centenas de anos atrás, o modelo hoje vigente, que exige prestação positiva do Estado para tutelar e efetivar direitos sociais, coletivos e difusos. O papel do Judiciário e a difícil relação entre aplicação das normas e exercício do poder são analisados pelos autores ao longo dos capítulos 5 e 6, introduzindo o debate sobre as instituições jurídicas no Brasil. Sobre esse ponto, Violeta Sarti Caldeira, doutora em Sociologia Política e mestra e graduada em Ciências Sociais, acrescenta: “É tarefa árdua delimitar a separação entre a esfera jurídica e a esfera política na Modernidade, sobretudo após criação dos direitos sociais no século XX. Mas, em especial, no Brasil, essa separação parece ser ainda mais difícil de ser feita. Aqui, as instituições jurídicas têm uma relação ainda mais intensa e complexa com as instituições políticas tradicionais, se compararmos com outros Estados contemporâneos”.
A instituição da cidadania
Quando há medida de igualdade entre os membros de uma comunidade política, e todos podem gozar do mesmo conjunto de direitos e deveres, institui-se o status de cidadania. O primeiro elemento de cidadania na Modernidade europeia foi o dos direitos civis, necessários ao exercício da liberdade individual e à vida econômica e social da sociedade capitalista de então. No século XIX, surgiram as reivindicações em torno do elemento político da cidadania, pela participação no exercício efetivo do poder (fosse como membro de um organismo dotado de autoridade política, fosse como eleitor). O século XX, por sua vez, consolidou o elemento social da cidadania, relacionado à capacidade de participar e se beneficiar da riqueza coletiva.
Na sociedade brasileira, entretanto, o status de cidadania ainda não é pleno. “No caso do Brasil, a cidadania é uma instituição política deficitária. Isso fica evidente com a desigualdade social que prepondera sobre a medida de igualdade que deveria ter sido introduzida por direitos civis, políticos e sociais. Desde a escravidão, que assinalou a pura denegação de direitos de cidadania aos povos subjugados, até os recentes retrocessos em torno de direitos civis e sociais provocados pela adoção de políticas neoliberais, a estratificação social brasileira tem se conservado impermeável à influência igualitária dos direitos”, explica Marcel Santos.
Nas páginas de “Uma introdução à política: Estado de direito, democracia e instituições da Justiça”, o leitor é provocado a refletir sobre o futuro de nossas instituições políticas e o modelo de sociedade que desejamos construir. Leitura altamente recomendada aos profissionais, acadêmicos e estudantes do ramo da Ciência Política, da Filosofia e do Direito. Obra já disponível para compra na Livraria Intersaberes.
Ficha técnica
Livro: Uma introdução à política: Estado de direito, democracia e instituições da Justiça Autores: Marcel Albiero da Silva Santos e Violeta Sarti Caldeira
Número de páginas: 276
ISBN: 9786555170771
Formato: brochura
Dimensões: 1,4 x 14 x 21 cm
Preço: R$110,40
Editora: Intersaberes
Mais informações sobre o livro “Uma introdução à política: Estado de direito, democracia e instituições da Justiça”
Sobre os Autores
Violeta Sarti Caldeira é doutora em Sociologia Política (2017) pela Universidade Federal do Paraná, mestra (2009) e graduada (2006) em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Marcel Albiero da Silva Santos é doutor e mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e graduado em Direito pela mesma instituição.